Multipropriedade?! O que é isso?
- Henrique
- 15 de fev. de 2023
- 3 min de leitura
Entenda melhor sobre essa forma alternativa de condomínio imobiliário.
Embora verdadeira, é desconcertante a constatação de que regulamentar nosso patrimônio parece ser uma das maiores preocupações do sistema jurídico. O Código Civil, que é a legislação com impacto mais frequente em nosso cotidiano – a Constituição Federal, embora juridicamente mais relevante, “parece” menos aplicável às nossas relações do dia-a-dia – não esconde seu caráter essencialmente patrimonial.
Algo que talvez não tenha ocorrido a todos é o fato de que o Código Civil brasileiro demonstra uma grande - para não dizer única - preocupação com as questões patrimoniais.
Ao longo dos mais de 2.000 artigos, vários deles subdivididos em parágrafos, outros em incisos e alguns poucos em alíneas, a Parte Geral do Código (i) trata das pessoas - físicas e jurídicas; (ii) passa pela classificação dos bens propriamente ditos e (iii) avança no exame dos eventos e negócios que ocorrem na vida das pessoas e que podem causar o aumento ou a diminuição do patrimônio.
Já na Parte Especial, o Código (i) trata do nascimento, classificação, cumprimento e extinção das obrigações que tenham repercussão patrimonial, inclusive (ii) disciplinando os contratos, que nada mais são do que instrumentos que materializam as obrigações; (iii) estabelece o regramento das sociedades, que na maioria vezes são constituídas com o objetivo de lucro - olha o patrimônio aí novamente!; (iv) dedica diversos capítulos à forma como as pessoas podem exercer poderes sobre os bens móveis e imóveis; (v) regulamenta as relações familiares, com notável preocupação sobre suas repercussões patrimoniais, para, na porção final, (vi) diante da principal certeza da vida, estabelecer as regras para a partilha do patrimônio dos falecidos.
Em resumo, é o patrimônio que importa!
E dentre as diversas formas que o Código admite que seja exercido o poder sobre os bens, a propriedade é a mais importante delas.
A divisão da propriedade, no entanto, não é estimulada pelo Código Civil. Na verdade, a divisão da propriedade - chamada de condomínio geral pela Lei - é apenas tolerada, afinal de contas é um fenômeno social inevitável.
E o que essa longa introdução tem a ver com a multipropriedade? Tem tudo a ver!
É que a multipropriedade foi instituída para funcionar como o meio do caminho entre a propriedade fracionada entre diversas pessoas, algo naturalmente difícil em razão da individualidade humana e a propriedade exercida exclusivamente por uma só pessoa, que é o cenário ideal, mas que nem sempre acontece.
Fruto dos estudos elaborados por grupo de trabalho formado pelo nosso parceiro SECOVI-SP e introduzida ao Código Civil em 2018, a multipropriedade é, basicamente, a divisão da propriedade em frações de tempo.
Um exemplo prático irá facilitar o entendimento das coisas!
Vamos imaginar que três pessoas sejam proprietárias, em partes iguais, de um imóvel construído em terreno com área de 210 m². Nesse exemplo, diante da área do terreno, as regras de parcelamento do solo consideram o imóvel é indivisível, tudo bem?
Naquela forma tradicional, que se chama condomínio geral, cada uma das pessoas – os coproprietários – é titular da fração ideal de 33,33% da propriedade do bem, podendo usá-lo livremente e a qualquer tempo, desde que respeitada a destinação do imóvel.
Já na multipropriedade, cada uma das pessoas – os multiproprietários – exerce 100% da propriedade sobre o bem, dentro da sua respectiva fração de tempo, que, por imposição legal, tem duração mínima de 7 dias, seguidos ou não.
Considerando que se divide o tempo e não o uso do imóvel propriamente dito, é menor a probabilidade de conflitos entre os multiproprietários, uma vez que, durante a fração de tempo de cada um deles, o uso é exclusivo.
Outro aspecto que contribui para a menor probabilidade de conflitos é que, na multipropriedade, a negociação da fração de tempo não depende da concordância dos demais multiproprietários. Já no do condomínio geral, os demais condôminos têm preferência sobre terceiros na aquisição da fração ideal, numa clara demonstração de que a lei busca, a todo momento, extinguir o apenas tolerado condomínio geral.
A multipropriedade é instituída por ato entre vivos ou pode ocorrer em testamento, deve sempre definir qual é a duração dos períodos correspondentes às frações de tempo e deve ser registrada no cartório de registro de imóveis, à margem da matrícula do bem.
Também é possível que a multipropriedade seja instituída sobre a unidade autônoma de um condomínio edilício, ou seja, sobre a sala de um edifício comercial, por exemplo, pode ser instituída a multipropriedade.
O sempre criativo e competente mercado imobiliário prontamente enxergou na multipropriedade uma valiosa ferramenta para aumentar o apelo comercial dos imóveis de veraneio, mas as possibilidades da multipropriedade são amplas e certamente serão ainda melhor exploradas ao longo do tempo.
O Gregatti e Rocha tem experiência no estudo de viabilidade e na instituição da multipropriedade.
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